No verão quente transmontano as festas sucedem-se e aos fins-de-semana sobrepõem-se em poucos quilómetros de distância. Ao longo do vale da Vilariça há muitas capelas mas há algumas que ao longo dos tempos foram palco de grandes manifestações de fé, de ponto de reunião das pessoas e que ainda mantêm esse papel. Estão nesta posição a romaria de Nossa Senhora do Castelo, em Adeganha e a de Nossa Senhora dos Anúncios, em Vilarelhos. Também a capela de Nossa Senhora da Rosa, em Sampaio, deve ter tido um papel de relevo, mas no presente está praticamente esquecida, mais por culpa do clero do que pela população da aldeia.
Nos dias 25 e 26 de Agosto realizaram-se as festa em honra de Nossa Senhora do Castelo. O local das festas situa-se num ponto estratégico situado no alto da fragada, nas fraldas do vale, com completo domínio do vale, razão pela qual o local foi escolhido deste os tempos antigos para a fixação do homem. No local existe um antigo povoado fortificado com vestígios da Idade do Ferro e da ocupação romana. Trata-se de um local cheio de história, de mística e como um dos melhores miradouros do vale.
Integram este santuário duas capelas, uma grande, bonita, dedicada a Nossa Senhora do Castelo, outra mais pequena, quadrangular, situada na beira da falésia, no ponto mais elevado do santuário.
No dia 19 de junho deflagrou um grande incêndio que devorou a vegetação dos montes em redor até poucos metros de distância do santuário. Assim, a somar ao aspeto de um ano excecionalmente seco soma-se o negro da fragada devorada pelas chamas, sem tempo nem gota de água para recuperar. Para minimizar este cenário negro o movimento do Grupo de Amigos de Adeganha deitou mão a uma ideia original: produzir flores em papel colorido e espalhá-las ao longo do percurso até ao santuário!
Por isso, havia muitos motivos para uma visita ao santuário, no dia 25 de Agosto.
Não conhecia o programa da festa. Imaginava o povo em procissão desde a aldeia ao santuário, mas os tempos mudaram e já há muitos anos que isso não é feito. Só me inteirei que não seria assim, na aldeia, depois de questionar alguns habitantes se o percurso até ao santuário seria feito a pé.
Parti para o santuário de carro, fazendo paragens ao longo do caminho para fotografar as flores em papel. Havia muito pó pelo caminho de cada vez que um carro passava.
Cheguei ao santuário perto das três da tarde. A calmaria ainda era muita e isso facilitou-e a vista a todos os espaços com a calma necessária. Surpreendeu-me a dimensão da capela e número de andores preparados para a procissão, uma dúzia. Estavam decorados com flores naturais, pelas mãos das pessoas de aldeia. Fizeram-no com tal dedicação e carinho que não ficavam nada a dever ao trabalho de um profissional da área.
Espalhados pelo santuário havia arranjos florais com flores em papel. Havia também quadros com a passagens das aparições em Fátima, com a Lenda das Açucenas, o batismo de Cristo e quadras sobre Adeganha.
A Eucaristia começou perto das seis da tarde. O pároco não se referiu a nenhum aspeto específico do santuário, mas as leituras foram sobre a vida de Maria e sobre Adão e Eva. Aproveitou para se despedir da população da paróquia e para a agradecer a forma como o receberam, dado que foi a última missa que celebrou em Adeganha.
Às sete saiu a procissão. Não deve ter sido fácil arranjar gente para transportar tantas bandeiras e estandartes e andores! Talvez seja boa ideia diminuir ao número e que apenas as pessoas que têm devoção façam essa tarefa porque há pessoas que não têm fé, nem respeito, confundindo a procissão com um qualquer desfile.
O percurso da procissão é curto mas acidentado. Não é fácil coordenar a subida e a descida de escadas carregando os andores.
A luz rasante do sol que começava a pintar de dourado a Vilariça ajudou a criar um ambiente de intimidade e oração. Um grupo coral contratado entoava cânticos que faziam eco nas cavidades das rochas e se refletiam pelo vale. Às oito horas terminou a procissão.
Caracteriza também esta festa o convívio das famílias em volta da mesa, mal a procissão recolha. Estendem-se as mantas (agora já há muitas mesas e cadeiras de jardim), abrem-se os cabazes (alguns até frigoríficos transportam para o santuário) e a festa é feita de comida e bebida tal como noutros tempos se fazia na Senhora da Assunção (Vilas Boas) ou no Santo Ambrósio (em Vale da Porca).
A comissão de festa tem a seu cargo a assadura dos frangos. São vendidos ao longo da tarde e são fornecidos mal acabe a procissão. Não faço ideia quantos são vendidos mas são seguramente largas dezenas!
O grupo musical que ia abrilhantar a noite tocou os primeiros acordes. Acenderam-se a luzes e o santuário ganhou mais magia.
Não fiquei para o arraial. Desci por uma estrada de terra batida para a Junqueira, prometendo não voltar a fazê-lo. Não é via recomendável a carros ligeiros, mas voltar para trás era impensável.
Gostei de conhecer e participar na festa de Nossa Senhora do Castelo. Fiquei, sobretudo, com vontade de lá voltar noutra altura do ano, quem sabe se em maio, com menos gente mas com outra paisagem e com outro espírito.
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